Políticas para a terceira idade
O envelhecimento impõe desafios significativos em termos de inclusão social na América Latina e no Caribe, especialmente no que diz respeito à garantia de renda adequada e ao acesso a serviços essenciais. As consequências das desigualdades acumuladas ao longo do ciclo de vida — como a alta incidência de informalidade laboral e a ausência de acesso a mecanismos de proteção social — tornam-se ainda mais evidentes nessa etapa. Esta seção analisa as políticas necessárias para fortalecer a proteção econômica das pessoas idosas por meio de sistemas de pensões, saúde e cuidados mais inclusivos.
Proteger a renda na velhice por meio dos sistemas de pensões
A velhice apresenta desafios importantes em relação à autonomia econômica. Nessa fase da vida, garantir segurança financeira é essencial para que as pessoas possam manter um padrão de vida digno. Os sistemas de pensões desempenham um papel central nesse processo, ao fornecer renda durante a velhice e proteger a população em casos de invalidez ou falecimento do cônjuge. No entanto, os elevados níveis de informalidade nos mercados de trabalho da América Latina e do Caribe fizeram com que uma parcela significativa da população chegasse à velhice sem ter cumprido os requisitos necessários para acessar as pensões contributivas, o que deixou muitas pessoas em situação de vulnerabilidade econômica (Álvarez et al., 2020). Essa realidade é ainda mais crítica para as mulheres, que apresentam menor participação laboral, maior exposição à informalidade e maior expectativa de vida.
Os sistemas de pensões não contributivas têm se mostrado uma política essencial para garantir uma renda mínima aos grupos mais vulneráveis durante a velhice. Desde os anos 2000, a cobertura foi ampliada em diversos países da região, alcançando, em alguns casos, um nível próximo da universalização. Entretanto, em países onde a cobertura de pensões contributivas é baixa (menos de 40 % da população idosa recebe uma pensão contributiva), a expansão dos sistemas não contributivos tem sido limitada, como ocorre na República Dominicana, El Salvador, Guatemala, Nicarágua, Colômbia, Peru e Equador (gráfico 3.15.A).
A adequação das pensões não contributivas continua sendo um desafio relevante. Um estudo recente de Vila et al., (2024) mostra que, em média, o valor dos benefícios como porcentagem da linha de pobreza aumentou 11 pontos percentuais nos últimos 12 anos, passando de 81 % em 2010 para 92 % em 2022. No entanto, observa-se uma considerável heterogeneidade entre os países. Enquanto em Argentina, Brasil, Chile e Uruguai as pensões superam a linha de pobreza, em Bolívia, Colômbia, El Salvador e Peru os valores são muito baixos, situando-se abaixo de 50 % da linha de referência. Outros países, como Costa Rica, Equador, México e Panamá, apresentam níveis intermediários, com pensões entre metade da linha de pobreza e a linha de referência (gráfico 3.15.B).
Um desafio central para os sistemas previdenciários da região é alcançar cobertura universal que assegure aos beneficiários um nível mínimo de renda capaz de evitar a pobreza. Diante da elevada informalidade laboral, isso implica, na prática, continuar ampliando o alcance das pensões não contributivas. O desafio não reside na criação de novos programas — a maioria dos países já os implementou —, mas sim em expandir sua cobertura e, em alguns casos, elevar os valores dos benefícios.
Segundo estimativas elaboradas para o RED 2020 (Álvarez et al., 2020), a universalização da cobertura previdenciária teria um custo médio entre 0,18 % e 0,24 % do PIB, dependendo de os beneficiários receberem uma pensão de USD 4 por dia (em paridade de poder de compra) ou o valor da principal pensão não contributiva vigente em cada país. No primeiro cenário, o maior desafio recai sobre os países com baixa cobertura previdenciária em geral, enquanto no segundo cenário, o desafio é maior para os países com altos valores de pensões atualmente (como Brasil e Uruguai). Esses valores poderiam quase triplicar — para 0,53 % e 0,66 % do PIB, respectivamente — ao se considerar a transição demográfica que os países enfrentarão nas próximas três décadas. Esse envelhecimento ocorre de forma significativamente mais rápida na região do que nas economias desenvolvidas que já passaram por esse processo. As reformas necessárias, portanto, devem ser planejadas e implementadas com urgência e em consonância com essas dinâmicas demográficas.
Diante da crescente demanda por recursos, outro desafio essencial para os sistemas de pensão — tanto contributivos quanto não contributivos — é garantir sua sustentabilidade financeira. Isso pode ser alcançado por meio de medidas como o aumento das alíquotas de contribuição dos trabalhadores, a ampliação da base de contribuintes (por meio de maior participação laboral de mulheres e pessoas idosas, bem como da redução da informalidade), o aumento de tributos gerais ou a revisão dos requisitos de tempo mínimo de contribuição e idade de aposentadoria. Também é fundamental simplificar e tornar obrigatórias as contribuições de trabalhadores autônomos. Esses desafios variam significativamente entre os países da região, exigindo, portanto, combinações específicas de políticas para cada contexto (Álvarez et al., 2020).
Gráfico 3.15 Cobertura e adequação das pensões
A. Cobertura de pensões contributivas e não contributivas (2022)
B. Adequação das pensões não contributivas (em relação à linha de pobreza. 100 = linha de pobreza).
Garantir acesso a uma cobertura adequada de saúde e cuidados
Na maioria dos países da América Latina e do Caribe, o acesso aos serviços de saúde está vinculado à formalidade no trabalho ou à percepção de uma pensão contributiva. Isso deixa uma parcela significativa da população fora dos sistemas de saúde baseados em contribuição. O Brasil é uma exceção, com um sistema de saúde universal. Para os idosos, que enfrentam maior risco de incorrer em gastos de saúde “catastróficos” — aqueles que superam 10 % da renda familiar —, essa limitação é especialmente crítica (Álvarez et al., 2020).
Os sistemas de saúde não contributivos são essenciais para garantir o atendimento médico aos grupos vulneráveis de todas as idades. No entanto, persistem desigualdades importantes de qualidade entre os sistemas contributivos e não contributivos, o que compromete o acesso a serviços necessários para tratar condições crônicas e prevenir doenças na velhice (Bancalari et al., 2024). Embora esses sistemas tenham se expandido na região, sua atuação tem se concentrado, principalmente, na população materno-infantil.
Para promover maior equidade no acesso à saúde, é indispensável ampliar a cobertura de pessoas fora dos sistemas contributivos e implementar planos explícitos que garantam o acesso universal a serviços médicos essenciais e de qualidade. Uma das vantagens desses planos explícitos é a capacidade de direcionar melhor os recursos disponíveis, priorizando serviços preventivos e curativos com maior impacto na saúde pública.
O envelhecimento populacional também intensifica a demanda por serviços de cuidado. Na América Latina, essa responsabilidade recai majoritariamente sobre as famílias, sobretudo sobre as mulheres, de forma informal e não remunerada. A ausência de políticas públicas específicas cria uma lacuna na oferta de apoio formal para pessoas idosas que necessitam de assistência em atividades cotidianas, ao mesmo tempo em que sobrecarrega famílias com restrições de tempo e renda. A formulação de políticas públicas voltadas a serviços de cuidado domiciliar, centros de dia e programas de apoio a cuidadores informais é fundamental para enfrentar os desafios do rápido envelhecimento populacional na região (Álvarez et al., 2020).